quarta-feira, 28 de novembro de 2012

A participação da SUSEP no logro do GBOEX

O GBOEX só conseguiu passar 50 anos enganando milhares de associados que envelheceram pagando por algo que, desde o início sabiam que não poderiam cumprir (o pagamento do pecúlio, nas condições contratadas) porque o órgão regulador e fiscalizador, a SUSEP -Superintendência de Seguros Privados, foi conivente, em vez de “proteger os interesses dos participantes e assistidos dos planos de benefícios”, conforme manda a lei (LC 109/2001, art. 3º, VI).


Ora, não existe nada mais forte para comprovar isso do que a constatação, feita pelo Ministério Público Federal, ao apreciar a situação do GBOEX, no bojo do Inquérito Civil Público (ICP 020/2010-97): “Vislumbra-se que o plano de pecúlio que a GBOEX não corre risco de insolvência desde agora, ou recentemente, mas sim desde que começou a comercializar apólices de seguro que não teria como adimplir”.


Desde o início, quando éramos jovens (e poderíamos ter contratado algo mais seguro) eles sabiam que pagaríamos anos e mais anos para nada ou pouco mais do que nada deixar para a família. O que fizemos foi sustentar empregos regiamente remunerados para um grupo de oficiais do Exército, durante os últimos trinta anos.

E a certeza de que fomos enganados vem da própria SUSEP quando reconhece (Termo de Diligência Fiscal SUSEP/DEFIS/GRFRS No. 007/2005) que a única saída é “sacrificar o produto”, o nosso pecúlio,“através da aplicação de reajustes técnicos, o que possibilitaria levar o produto à expiração de forma mais equilibrada, sem sobrecarregar o resultado positivo dos outros produtos da entidade, nem os seus resultados financeiros e patrimoniais”. Uma sucessão de reajustes na mensalidade, até que se torne insustentável e leve o associado, um a um, a pedir sua exclusão, sem qualquer ressarcimento, deixando para trás meio século de contribuições. E a operação para “sacrificar o produto” já se iniciou: a mensalidade já dobrou e vai, no mínimo, triplicar até o ano de 2017, segundo garantias dadas pelo GBOEX à SUSEP (Parecer SUSEP/DITEC/CGSOS/COPRA/DIPEP/ No51/12).

Ou seja, não existe dúvida que esta massa de uns 150 mil associados, cuja idade média anda pelos 80 anos, foi enganada. E o GBOEX não conseguiria enganar tantos, por tanto tempo, sem a conivência de quem tem por dever “proteger os interesses dos participantes e assistidos dos planos de benefícios”. E vou provar:

TRINTA ANOS TRÁS


1.         O GBOEX chegou ao fim dos anos 70 como uma carteira de pecúlios com inconsistência atuarial, incompatível com a nova ordem ditada pela Lei 6.435/77 e fragilizada financeiramente por uma gestão que não pautava pelo profissionalismo. “O GBOEX estava pronto para acabar”, na opinião de Iese Rego Alves Neves, fundador e líder do MLD– Movimento Luta e Diálogo, grupo que comanda a entidade desde 1981, sem oposição.

2.         A CPI que investigou o sistema nacional de Previdência Privada (Câmara dos Deputados, 1996), em seu relatório deixa claro que na “implantação da regulamentação da Lei 6435/77 tinha-se como certo que não seria possível a adaptação dos planos de benefícios operados antes da vigência da lei pela completa ausência de embasamento técnico. Esperava-se uma grande operação de saneamento no setor” e que na “época, o governo deveria ter dado um fim às “arapucas” dos montepios. A bem do interesse público era necessário adotar uma atitude compatível com a situação, determinando-se o encerramento de atividades e conseqüente liquidação de todas as entidades, cujos planos não tinha consistência atuarial, para dizer o mínimo”.

3.         E o GBOEX, além de não ter a necessária consistência atuarial, no entender da CPI, era a maior dessas “arapucas”,com o patrimônio líquido equivalente a 63% do total dos ativos das entidades sem fins lucrativos com planos bloqueados, ou seja, era o maior dos rombos do Sistema de Previdência Privada.

4.         E por que o governo (SUSEP) não tomou as devidas providências? A resposta está no Relatório da CPI que justifica a inércia governamental, em parte, pela “presença de militares que comandavam ou tinham ligações com grandes montepios, fator de peso político considerável na época. Não havia vínculo formal dos montepios com as Forças Armadas, porém induzia-se a população a acreditar no contrário, já que o nome de organizações militares integrava a denominação social de vários montepios”.Porque naquela época o “poder político dos maiores montepios decorria do fato de serem entidades organizadas com base em associações de militares, notadamente oriundos do Rio Grande do Sul”.

5.         O GBOEX que estava pronto para acabar sobreviveu às turbulências dos anos 80 com uma carteira de pecúlios condenada, graças ao enxugamento promovido por Iese Rego Alves Neves ao reduzir os gastos com administração de 80% para a faixa dos 20%, em relação à receita operacional e fechar uma série de empresas subsidiárias que serviam para criar empregos e dar prejuízo.

 VINTE ANOS ATRÁS

6.         Em 1990, aflorou o déficit no plano de pecúlios e, diante da já demonstrada incapacidade de gerar produtos novos, a decisão foi dobrar os planos de pecúlios de cada associado, sem a sua anuência, em uma operação totalmente irregular e suicida, por mim denunciada diversas vezes, porque provocaria um déficit duplamente maior no futuro. Na ocasião escrevi um texto “As viúvas do GBOEX” em que fazia relação com o movimento das viúvas do liquidado MFM – Montepio da Família Militar que tomou as ruas de Porto Alegre, após o calote tomado. A massa integrante desta carteira de pecúlios que deveria ser ampliada com renovação de idade, buscando sair dos 60 anos, como idade média, para a faixa dos 40 anos, foi duplicada com a idade média permanecendo nos 60 anos.
7.         E tudo isso com, no mínimo, a omissão, da SUSEP que, diante da denúncia por mim formulada (2003), saiu com evasivas do tipo “situação fática consolidada” e “prescrição administrativa” quando, na realidade, o que existiu foi omissão no cumprimento da missão que está muito clara no artigo 3o da Lei Complementar 109/2001: fiscalizaras EAPC e proteger os interesses dos participantes e assistidos dos planos de benefícios.

8.         A prova de que tal operação é irregular: a SUSEP multou o GBOEX, por idêntica operação, realizada depois da minha denúncia, em um valor unitário (R$ 2.457,24) que, se de base servisse para a duplicação de 250 mil planos, ultrapassaria várias vezes o seu patrimônio líquido.

 DEZ ANOS ATRÁS

9.         O GBOEX entrou nos anos 2000 sofrendo as conseqüências do déficit não enfrentado e agravado, em 1990, e que começou a queimar mensalmente R$ 3,5 milhões do seu patrimônio o que a SUSEP somente foi acusar em fiscalização provocada por meu pedido de intervenção, no ano de 2003.

10.      Nesta ocasião, protocolei uma reclamação/denúncia (processo SUSEP 15414.200047/2003-38) com pedido de intervenção no GBOEX por má gestão da carteira de pecúlios (confirmado em 2011 pelo MPF quando considerou que uma “má gerência administrativa” no GBOEX vem “onerando consumidores inocentes e vítimas de uma prática contratual patológica”).

11.      Inicia-se, então, um processo de abafamento da denúncia que foi comprovado pela própria SUSEP, através de um parecer do corajoso chefe do DECON/GEACO/DIMES (2006), ao analisar os autos do processo.

12.      Diante da denúncia, a Procuradoria Geral da SUSEP, “provavelmente por haver considerado grave o assunto”, manifestou-se no sentido de levar ao conhecimento do Colegiado da SUSEP, mas “um despacho virtualmente ilegível, de signatário não propriamente identificado, rabiscado informalmente, diz-se que a matéria não é digna da atenção do Órgão Colegiado da SUSEP. Ao lado do referido garrancho, novo despacho, desta feita enviando os autos, a pedido, ao Sr. Eliezer Tunala”, registra o mencionado parecer.





13.      Por pressão de investigação na Câmara Municipal de Porto Alegre, em julho/2003, foi efetuada uma fiscalização, no GBOEX, cuja conclusão apontava para a intervenção, mas que ficou pendente da viabilidade de um planejamento estratégico elaborado às pressas, com a nítida intenção de servir como justificativa para a não intervenção.

14.      No início de 2004, volta o Sr. Tunala: mesmo diante da declaração de inviabilidade do tal plano de recuperação apresentado pelo GBOEX, considerou o assunto encerrado e mandou arquivar o processo que só foi reaberto porque fiz uma reclamação junto à Procuradoria da SUSEP que mandou desarquivar por ter sido arquivado sem conclusão.



15.      Dito processo perambulou por diversas gavetas, “manipulado por critérios gerenciais frouxos”, “com enorme inércia burocrática”, no entender do chefe do DECON/GEACO/DIMES, até que foi arquivado em 2009 com o GBOEX tendo perdas patrimoniais da ordem de R$ 3 milhões/mês e tendo o tal plano de recuperação sido considerado inviável, ou seja, não aplicaram a intervenção porque não quiseram.


16.      Agora, finalmente, o Ministério Público Federal, ao analisar a representação feita sobre o mesmo assunto (perdas patrimoniais), acaba de oficiar à SUSEP solicitando que “avalie tecnicamente a pertinência e oportunidade de submeter a empresa GBOEX ao regime de direção fiscal, com vistas a colocar em equilíbrio atuarial o produto Pecúlio Taxa Média e, assim, salvaguardar os direitos e interesses dos consumidores deste Plano, fundamentando eventual decisão negativa”.
17.      Ou seja, consegui o reconhecimento do acerto do meu pedido de intervenção 108 meses após o que significa, com um déficit mensal de R$ 3 milhões, uma perda patrimonial da ordem dos R$ 300 milhões.

18.      E a medida recomendada pelo MPF e por mim solicitada em 2003 está de acordo com o que a lei ordena.

19.      O art. 44 da Lei Complementar 109/2001, que dispõe sobre o regime de previdência complementar, estabelece que para resguardar os direitos dos participantes e assistidos poderá ser decretada a intervenção na entidade de previdência complementar, desde que se verifique, isolada ou cumulativamente, uma das condições previstas nos incisos de I a VI.

20.      Situação atuarial desequilibrada (V): é notória e foi atestada pelo MPF ao constatar que o risco de insolvência acompanha o plano de pecúlios majoritário desde que começou a ser comercializado quando já sabiam que não teria como adimplir. A própria SUSEP reconhece que a única saída é forçar a saída dos seus integrantes através de sucessivos reajustes que tornem a mensalidade insuportável.

21.      A transferência da metade dos imóveis de renda para a seguradora Confiança que os reavaliou e incorporou ao seu patrimônio pelo dobro do valor e que agora os está alienando para minorar seus problemas de insolvência chega às raias de um desfalque patrimonial, de uma fraude ao credor visto que se destinavam a garantir o pagamento de pecúlios cujo atraso é notório, diante das centenas de reclamações. Aplicação dos recursos de forma inadequada (II) e descumprimento de disposições estatutárias (III) visto que o Estatuto é claro: o patrimônio do GBOEX destina-se a assegurar a vida da entidade e a sua finalidade que é o pagamento dos pecúlios (art. 62) e que para garantir o pagamento dos pecúlios o seu patrimônio somente poderá ser aplicado, “dentro de critérios de rentabilidade, de segurança e de liquidez, em imóveis, em títulos ou em valores imobiliários, observadas a diversificação e as condições de mercado” (art. 67).

22.      A seguradora Confiança vem sugando o patrimônio do GBOEX desde os anos 70 quando foi feita a primeira transferência de um dos imóveis do GBOEX e está longe de ser considerado um investimento seguro.

23.      Atropela, também, o inciso IV do art. 44 porque o desequilíbrio do plano de pecúlios que respondia por 75% da receita operacional afetou a liquidez e a solvência dos demais planos cujos superávits estão sendo empregados para cobrir parte deste déficit, conforme reconhece a própria SUSEP.
 
Diante da omissão do órgão regulador e fiscalizador em “proteger os interesses dos participantes e assistidos dos planos de benefícios”, resta a esta massa de milhares de consumidores buscar, através de uma ação judicial, o ressarcimento dos prejuízos causados pela inépcia da fiscalização o que, aliás, já foi lembrado por ocasião da CPI da Previdência Privada (Câmara dos Deputados, 1996) quando no seu relatório consta, ao abordar a “Sistemática de Fiscalização da SUSEP” (pág. 199-203): “É oportuno mencionar que o Banco Central já foi condenado pela justiça (no TRF-RJ pelo caso Coroa-Brastel) a indenizar pessoas que foram prejudicadas pela inépcia de sua fiscalização. Isso nos autoriza a alertar para a possibilidade de dano ao Erário também no caso da SUSEP, se o Executivo não adotar as medidas necessárias para aparelhar o órgão dos devidos recursos humanos e materiais. A SUSEP não possui controles adequados que lhe permita conhecer a situação financeira das entidades abertas,o que traz profunda insegurança aos participantes do sistema”.